"MISSA SERTANEJA?"

 O que dizer da chamada “Missa sertaneja”?

 

 01. A música dentro da Igreja Católica é um instrumento fundamental para a expressão da fé. Como toda ferramenta, há de ser utilizada com sabedoria, prudência, discernimento.

02. Em algumas comunidades eclesiais se tem criado e mantido o costume de utilizar melodias de músicas populares já existentes como base para expressões musicais católicas, particularmente para a Santa Missa (hinos, aclamações, litanias, salmos e cantos).

03. Ora, tal praxe destoa de toda a tradição musical católica, que sempre procurou reservar para os Sagrados Mistérios o que há de mais digno para prestar culto ao Senhor, edificar a assembléia e, assim, testemunhar a sua fé. Com todo esmero a Igreja tem procurado oferecer ao Senhor expressões musicais próprias, obra do Espírito e fruto da fé unida à caridade.

04. Deste modo a Igreja tem recomendado: “Poder-se-ão admitir ao culto divino as formas musicais, as melodias e os instrumentos de música, ‘contanto que sejam adequados ao uso sacro, ou possam a ele se adaptar, condigam com a dignidade do templo e favoreçam realmente a edificação dos fiéis’”[1]. Nos tempos do Papa S. Pio X se deu o problema da interferência da música teatral profana no repertório musical litúrgico, particularmente na Itália, contra o qual o Sucessor de Pedro ergueu a voz em 1903[2]. Recentemente o Papa João Paulo II fez referência a estes abusos, reafirmando que “não todas as formas musicais podem ser consideradas aptas para as celebrações litúrgicas”[3].

05. A Igreja no Brasil, em sintonia com estes princípios universais, tem solicitado que se evitem músicas profanas – letra e/ou melodia – ao interno das celebrações litúrgicas:

“Em relação aos textos, evitem-se os cantos com letras adaptadas. Além de ferir os direitos do autor, tal adaptação, por si mesma, revela a inconveniência do original que será mentalmente evocado, evidenciando empobrecimento da celebração litúrgica e desvirtuando o seu sentido”[4];

“O canto litúrgico não pode prescindir da experiência musical popular e folclórica. Conseqüentemente, para criar uma música litúrgica inculturada, o caminho correto não é o de usar melodias existentes, transpondo-as para a liturgia com um novo texto, mas sim o de criar algo novo, trabalhando com as constâncias melódicas, rítmicas, formais, harmônicas e instrumentais da música brasileira, levando em conta a comunidade concreta, a cuja oração comunitária cantada o compositor queira servir”[5];

“A criação de um repertório bíblico-litúrgico pressupõe o cumprimento de alguns critérios básicos a saber: (...) b) as melodias sejam acessíveis à grande maioria da assembléia, porém, belas e inspiradas; c) sejam evitados melodias e textos adaptados de canções populares, trilhas sonoras de filmes e de novelas”[6].

06. Por conseguinte, admitem-se nas Santas Missas melodias e textos que sejam de autoria e inspiração cristãs; nada impede o uso de certos ritmos locais, de acordo com as circunstâncias celebrativas e suas partes específicas, desde que a prioridade sempre recaia sobre a mensagem veiculada, pois cantar é uma forma de rezar.

07. Não é a Sagrada Liturgia que deve se adaptar à arte, mas – falando sob a perspectiva da fé – é esta que deve se adaptar à aquela. A música há de ser uma expressão viva da fé (textos, melodias, ritmos, arranjos etc.), favorecendo a mesma, sempre e em todos os lugares. “Na liturgia o canto é um sinal de natureza sacramental”, afirma o Mons. A. Onisto. “Com todos os outros sinais sacramentais próprios da ação litúrgica (palavra, assembléia, gestos e movimentos etc.), também o canto mostra, produz e anuncia a salvação operada por Cristo...”[7]. Oxalá todos os que ministram a música sacra estejam imbuídos deste verdadeiro espírito cristão em seu prestimoso serviço a Cristo e à Igreja.

Santuário da Divina Misericórdia – Curitiba,PR, 31.08.08.

 

[1] Congregação para o Culto Divino, A Liturgia Romana e a Inculturação. IV Instrução para uma correta aplicação da Constituição conciliar sobre a liturgia, 25.01.1994, n. 40. É citado: Concílio Vaticano II, Constituição Sacrosanctum Concilium, n. 120. Os destaques são nossos.

[2] Cf. Motu Proprio Tra Le sollecitudini [Entre as solicitudes] sobre a música sacra, 22.11.1903, n. 6.

[3] Quirógrafo para o centenário do Motu Proprio “Tra le sollecitudini” sobre a música sacra, 22.11.2003, n. 4. Cita-se: Idem, Encíclica Ecclesia de Eucharistia, 17.04.2003, n.50.

[4] Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, Pastoral da música litúrgica no Brasil, 1976, [Documentos da CNBB: n. 7], Cap. III, n. 3.9.

[5] Idem, A música litúrgica no Brasil, 1998, [Estudos da CNBB: 79], n. 235.

[6] Idem, Guia litúrgico-pastoral, 2. ed., 2008, cap. VII,1.

 

[7] In Frattallone, Raimondo, Musica e liturgia, 2. ed., Ed. Liturgiche, Roma, 1991, p. 70.

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